Existem pais que, por trabalharem muito, perdem a oportunidade de verem os filhos crescendo. Preocupam-se mais com sua carreira, em ganhar dinheiro para pagar as contas, em participar de reuniões que invadem a noite, do que em sentar no chão e brincar com o moleque ou com a menina.
Embora não tenha filhos, eu deixei de ver muita gente crescendo em minha família. Dia desses, isso me fez chorar. Desde que saí de casa, aos 18 anos, para fazer faculdade, de certa maneira distanciei-me da minha família. Estive presente em momentos como casamentos, formaturas, nascimentos, algumas perdas. Mas não me preocupei em estar perto naqueles momentos mágicos, em que minhas irmãs construíram algo único e especial.
O motivo do meu choro e da imensa sensação de perda, foi ter assistido, em vídeo, ao belíssimo trabalho que minha irmã Alessandra fez, durante muitos anos, junto a crianças especiais de Franca, onde vive toda a minha família. Há anos ouço-a falar com orgulho desse projeto, onde ela já apresentou peças como O Pequeno Príncepe, A menina e o pássaro encantado, Cinderela, entre vários outros.
Os atores do projeto, chamado Tateando, são crianças especiais, algumas com dificuldades motoras, outras visuais, auditivas, mentais. Mas todas dotadas da capacidade de amar e realizar sonhos. Ao assistir aos videos que ela me emprestou, vi um Pequeno Príncepe na cadeira de rodas, conversando com seres de diferentes planetas e dando valor real a uma rosa. Vi uma menina cega em busca do pássaro que se foi. Ouvi a voz de minha irmã cantando uma bela música em homenagem aos seus atores, em tablados simples, atuando como se estivessem em palco encantado, onde limites são imaginários.
Infelizmente, jamais estive presente em uma dessas apresentações. Primeiro a carreira, depois o mestrado. Várias vezes, em casa, vi minha mãe e minhas irmãs trabalhando para criar o Mundo de Oz ou então o reino da Feiolândia, tão vivos em nossas memórias de quem vivenciou intensamente o reino infantil dos contos de fadas. Nunca me ofereci para ajudar. Nunca pude participar.
Minha irmã mais nova cresceu. Aquela a quem chamávamos de Bazinho, a mais mimada de todas as irmãs. Aquela que enfrentou desafios, que rompeu barreiras, que teve a coragem de propor, em uma cidade onde as pessoas com deficiência ficavam escondidas em suas casas, um projeto onde elas passaram a ter direito às luzes da ribalta.
Ela cresceu. E eu não vi. Deixei que se passassem momentos tão belos, tão únicos.
Ao assistir aos vídeos, chorei muito pelo que perdi. Pelo tempo que não dediquei às minhas irmãs, à minha mãe, aos meus sobrinhos. Muitas vezes em minha vida coloquei a carreira em primeiro lugar. Tive muitos ganhos com isso, mas também algumas perdas. Entre elas, não vi minha irmãzinha crescer. Não vi de perto sua coragem em enfrentar preconceitos, em conseguir recursos para viabilizar seu projeto, em transformar meninos perdidos em verdadeiros Peter Pans.
A vida é feita de escolhas. Elas nos conduzem. Algumas vezes nosso rosto ficará marcado por sorrisos, outras por lágrimas. Neste momento, elas caem, quando assisto novamente o vídeo referente ao seu trabalho, tão lindo. Parece-me que agora ele será encerrado, porque houve algum tipo de mudança entre as pessoas que coordenam o projeto. Mas minha irmã plantou uma semente de amor, de respeito pelas diferenças. Ela mostrou que é possível que uma criança especial seja chamada de especial por realmente ser capaz de expressar seu talento, seja em que corpo for, seja em que alma for.
Não se pode recuperar o que se deixou para trás, mas se pode reconhecer algo que toca a alma. Parabéns Alessandra. Minhas lágrimas de emoção são hoje para você!
Para quem quiser conhecer um pouquinho este trabalho, clique aqui para assistir a um dos vídeos, que tomei a liberdade de colocar no You Tube. Tem também um link para uma reportagem exibida pela EPTV de Ribeirão Preto. Vale a pena assistir. Clique aqui.
Um comentário:
Oi Drika que história mais linda da Alê. O mundo está precisando de mais pessoas como ela. Dê o nosso parabéns à ela pelo lindo trabalho. E você minha amiga, mais uma vez nos leva a viajar pelos seus belíssimos textos. Obrigada por compartilhar. Beijinhos com carinho
Família Bloco
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