Todos os anos, na primeira semana, faço uma mega limpeza em casa. Uma limpeza que envolve, principalmente, tirar o velho e abrir espaço para que o novo possa entrar. Novas energias, principalmente. Organizo estantes, gavetas, cds, o quartinho da bagunça. Tenho um princípio: se não estiver usando algum objeto pelo período de um ano, se nem olhei para ele, é porque não me serve mais, está apenas ocupando espaço.
Há exceções, como as roupas de frio que ficam armazenadas nas malas, vestidos de casamento e sapatos de formatura. Tem também aquela velha máquina de datilografia, que comprei com meu primeiro salário de jornalista (uma relíquia!). As cartas trocadas com amigos na época da faculdade. Os velhos diários. Fotografias amareladas pelo tempo...
Como saber o que fica e o que sai? Como saber se posso jogar fora ou doar aquela roupa, aquele sapato? Como decidir se jogarei fora os velhos diários? As roupas fora de moda ou que não me servem mais? Que critério adotar para reforçar aquele que já tenho e que nem sempre cumpro?
Não sei. Jogo muita coisa fora, dou muitas coisas para quem precisa. Tanto que agora, fui olhar o que poderia doar para os flagelados das enchentes no Rio e não encontrei nada. Nem roupas, nem sapatos. Vou doar em dinheiro, acho que pode ser mais útil.
A limpeza de casa sempre me faz pensar na faxina que preciso fazer em meus sentimentos, em minha alma e em meu coração. Há tristezas e mágoas que quero muito jogar fora, sem nunca olhar para trás. Há lembranças que brigam por um espacinho, que me pedem para ficar mais um tempo. Há alegrias tão grandes que são cuidadosamente embaladas em papel de seda perfumado, guardadas cuidadosamente em gavetas da alma. Há pouquíssimos arrependimentos, mas eles existem e ficam lá, na fila esperando para serem jogados fora. Há muitas conquistas, pessoais e profissionais, que me mostram do que sou capaz. Essas eu guardo em um portfólio do qual lembro de tirar a poeira de vez em quando.
Há também os sorrisos, as histórias de amor felizes, os momentos de prazer, as viagens, as alegrias e as lágrimas em família, a criança que fui, os cachorros da infância, as músicas do meu pai que eu reinvento algumas vezes, o colo da minha avó. Há o medo da morte em momentos extremos. O sentimento ambíguo em relação à solidão, que ao mesmo tempo me atrai e me repele. Há o medo do desemprego, de deixar de ser independente, de perder quem amo. Futuro mistura com presente.
Objetos e sentimentos se misturam nessa faxina anual. Coisa de gente organizada que sou. Das coisas me desapego fácil. Das memórias nem tanto. Leio mensagens que falam na importância de virar a página, deixar para trás e crer na beleza que há nos recomeços. Hora de abrir espaço nas gavetas do coração. Jogar as velhas mágoas fora e deixar que o novo entre. Desaprender os velhos medos e a arte de levantar barreiras.
Tem uma música bem antiga, da sempre maravilhosa Vanusa, que diz assim: "hoje eu vou mudar, vasculhar minhas gavetas, jogar fora sentimentos e ressentimentos tolos". Adoro esses versos e sempre que vasculho as gavetas da alma penso nela.
Lembro-me também do meu querido amigo Marcelo Couto, que tem uma frase que adoro: "Estão fazendo faxina para o céu e mandaram todos os anjos aqui para a terra". Se algum anjo por acaso estiver lendo este texto, tem espaço livre aqui. Vem?
Algumas músicas são clássicas. Alguns artistas nos marcam. Essa canção de Vanusa é uma delas. A letra tem muito a ver com o que escrevi. Mudanças, com Vanusa. Clique aqui. O vídeo é meio brega, mas a letra vale a pena em momentos de faxina em nós mesmos.
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